A DIVISÃO DO “SER” HUMANO
- Agnalda Carneiro

- 8 de jul. de 2020
- 3 min de leitura

Historicamente a sociedade criou uma fábula onde divide o ser humano em duas metades: “homem” e “mulher” e impõe estereótípos que devem ser cumpridos por cada uma das partes que desejem ser aceitas por este meio e que claramente estimula a rivalidade entre ambos. O fato é que independente do sexo biológico, a primeira casa de todos é o ventre de uma mulher, o que leva a refletir quanto aos desatinos sofridos e desafios enfrentados especialmente pelo pequeno homem.
Násio (1999) relata que as pulsões sexuais pontuam o desenvolvimento da criança desde seu nascimento e culmina entre os três e cinco anos de idade, quando surge o complexo de Édipo, que marca o apego da criança àquele dos pais que é do sexo oposto ao dela e sua hostilidade para com o do mesmo sexo.
Em seu texto “Três ensaios sobre sexualidade”, Freud (1905) apresenta as fases das pulsões sexuais infantis que se distinguem conforme a dominância da área erógena, das quais aqui destaca-se a fase oral onde prevalece a boca; fase anal com dominância do ânus e a fase fálica com a primazia do falo, mas será dispensada maior atenção a fase oral e fálica.
A fase oral abrange os primeiros meses de vida, onde o bebê experimenta o prazer da sucção pela boca, em movimentos com alternância ritmada entre lábios e lingua. Nesta fase mais do que estabelecer o amor maternal, a criança também vivencia o amor objetal. O prazer oral nada tem haver com o prazer de alimentar-se, logo o objeto do prazer oral é o seio materno e, mais tarde, o próprio corpo, geralmente o polegar. Psicanaliticamente falando, ao observar uma criança que chupa o polegar com seu olhar sonhador deduz-se que ela está experimentando um intenso prazer sexual. O apego aos objetos reais são apegos a objetos fantasiados e esses objetos fantasiados representam o próprio eu. Assim o seio da mãe ou o polegar que a criança suga são, na verdade, um objeto fantasiado que ela acaricia, ou seja, ela mesma, seu próprio eu e aí identificamos um outro importante conceito da psicanálise, o narcisismo.
Na fase fálica, a criança descobre seus genitais e aqui os objetos reais são o clitóris, como fonte de excitação, para a menina e o pênis, como objeto dominante, para o menino, enquanto o objeto fantasiado é denominado falo. Cabe esclarecer que psicanaliticamente o falo não representa o órgão sexual peniano de fato, mas sim a fantasia e superestimação enquanto símbolo do poder que rodeia este órgão do qual as meninas são privadas e os meninos são possuidores.
Tradicionalmente por ser a figura materna a responsável por gestar a vida construiu-se a fantasia de que a mulher naturalmente é constituída pelo amor incondicional, pelo dom do cuidado, pelo instinto de proteção. De outro lado o homem é percebido socialmente como o viril, o bruto, o que não chora, o insensível, o provedor.

Mas atualmente, ainda que muitos monstros rondem a necessária liberdade de expressão, já é possível reconhecer conflitos que seres humanos vivenciam consigo próprios e já é sabido que o amor materno não é inato, muitas mulheres não sentem este amor e quando sentem este amor é aprendido e construído de acordo com a história da maternidade de cada ser humano, e nem precisa ser incondicional, a ambivalência esta em todas as relações, não existe amor puro e não existe ódio puro, na mesma relação de amor existe ódio e hoje, inclusive na maternidade, já podemos reconhecer isso.
Penso que nas próximas décadas precisamos seguir desconstruindo certos paradigmas e fomentando maior colaboração ao invés de competição. Então fica a reflexão: se somos seres humanos vindos da mesma origem e se este amor é aprendido pela mulher, não pode ser aprendido também pelo homem?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BADINTER, E. XY sobre a identidade masculina, Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1993.
NASIO, J-D. O prazer de Ler Freud, Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 1999.
FREUD, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud (1901-1905): edição standard brasileira, vol. VII, Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREUD, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud (1914-1916): edição standard brasileira, vol. XIV, Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREUD, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud (1923-1925): edição standard brasileira, vol. XIX, Rio de Janeiro: Imago, 1996.
SOBRE A AUTORA:
Agnalda Carneiro é estudante de Psicologia na Faculdade Nove de Julho. Tem experiência em Psicologia Transpessoal com ênfase em subjetividade, inconsciente e espiritualidade. Possuí formação em PNL e Constelação Sistêmica pelo NDI 4 Tempos. Atua na área de Diversidade, Inclusão, Cidadania e Educação Corporativa. Atua como voluntária na equipe multidisciplinar do CER II Osasco para reabilitação de pessoas com deficiência fisica e intelectual. É membro da LAPP – Liga Acadêmica de Psicanálise e Psicopatologia, onde faz parte dos Grupos de Estudos sobre “Masculinidades”, “Diálogos sobre as Obras de Freud” e “Shakespeare e a Psicanálise” e, também, das Oficinas “Arteterapia e a Pisicanálise” e “Inconsciente Mod. I e II (Sonhos, contos de fadas e arteterapia)”.





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Agnalda parabéns pelo texto.
Necessário mesmo falar de amor e que os homens não tenham medo de amar.
Lindo.
Agnalda arrasou no texto! Parabéns!!!!